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O renascimento do Cheonggyecheon

O renascimento do Cheonggyecheon

Coréia do Sul

Por sua história, importância e projeto de revitalização o Cheonggyecheon era um dos lugares de Seul que mais me despertaram a curiosidade. Se você já procurou Seul no Google provavelmente deve ter visto muitos prédios, neons e alguma imagem como esta que ilustra o post. Dá para acreditar que este riacho já ajudou a cidade a controlar as enchentes, foi esgoto a céu aberto, separou ricos e pobres, foi aterrado e escondido debaixo de um viaduto por quase quatro décadas?

Em 2005 através de um oneroso e intenso projeto de revitalização urbana teve sua importância histórica e cultural restaurada. Hoje é um dos cartões postais de Seul, ponto de encontro dos seulitas e um exemplo a ser seguido.

Como se pronuncia? O que significa?

Em coreano escreve-se  청계천 e pronuncia-se tchón-guie-tchón – ou /tʃʌŋgjetʃʌn/ no alfabeto fonético. Seu nome quer dizer córrego (gyecheon) límpido (cheong).

Por que é tão interessante?

O córrego recebeu este nome durante a ocupação japonesa (1910-1945). Entretanto, podemos considerá-lo límpido apenas em 2005. Explico. Antes mesmo de Seul (na época Hanyang) tornar-se a capital da Coréia o córrego, de formação natural, drenava as águas das montanhas ao redor até o rio Han (Hangang: sendo gang rio em coreano). No início do século XV, durante a Dinastia Joseon, o Rei Taejong comissionou a ampliação do veio para controlar as inundações que ameaçavam os moradores de Hanyang. Com a obra, passou a ser chamado de Gaecheon (que significa córrego, arroio, veio). O feito incluiu a dragagem e reforço do banco do riacho, a construção de barragens de pedra e de pontes. Além de ajudar no controle das enchentes sua função era de captar o esgoto das casas e levá-lo para um rio bem maior, o rio Han (Hangang).

Cheonggyecheon
Vista do riacho no começo do século XX. Foto: Naver

Durante a época da colonização japonesa Gaecheon teve o seu nome trocado para Cheonggyecheon. À época serviu como fronteira natural entre o bairro de Jongo e a cidade japonesa de Honmachi.  Com a liberação japonesa em 1945 e o término da guerra da Coréia (1950-1953) muitas pessoas se mudaram para a capital para reconstruirem suas vidas. O êxodo fora sem precedentes e de maneira desorganizada. Muitos se instalaram ao longo do curso do riacho e a região tornou-se uma grande favela. Não havia estrutura para comportar tanta gente de uma só vez. Logo o córrego estava pútrido, cheio de fezes, areia, lixo e assoreado. O fedor era intenso e representava um grande problema de saneamento para a cidade.

Cheonggyecheon
Córrego em 1968. Foto: Homer Williams (CC BY-NC 2.0)
Cheonggyecheon
Parte do riacho no início dos anos 70. Foto: jho93700 Blog
Cheonggyecheon
Final da década de 50 e começo dos anos 60. Inicia-se a cobertura do córrego. Foto: Flowerbud Blog
Cheonggyecheon
Trabalhadores que viviam na região. Foto: Naver
Cheonggyecheon
Habitantes nos anos 70. Foto: Flowerbud Blog
Cheonggyecheon
Crianças brincando no banco de areia. Foto: Flowerbud Blog

Alarmados com a situação e movidos pela rápida industrialização do pós guerra, o governo começou a cobrir o córrego numa operação que durou quase 20 anos, começando em 1958. Em 1976 um elevado, de 5.6km de comprimento e 16m de largura, fora inaugurado. A área tornou-se um exemplo de modernidade para a Coréia do Sul. Durante os anos 80 e 90 a área tornou-se o barulhento e sujo centro de Seul.

Cheonggyecheon
Elevado erguido sobre o riacho e aberto em 1976. Foto: Naver

Em 2003 visando tornar Seul uma cidade mais ecológica o projeto de restauração do Cheonggyecheon tomou forma. O projeto também visava recuperar o valor histórico e cultural do córrego, escondido há 30 anos, e revitalizar a economia da metrópole.

Cheonggyecheon
Foto comparativa com as três fases do projeto: antes, durante e depois. Foto: Namsung

 O  desafio e a solução

O envelhecimento do elevado e da plataforma de concreto, que cobriam o córrego, impunham riscos à segurança e precisavam de reparos imediatos ou a remoção. O governo metropolitano também buscava alternativas para integrar o  norte e o sul da cidade, separados pelo elevado. Havia grande preocupação com o aumento do congestionamento e, inclusive, com um cenário de caos instaurado caso fosse removido o elevado; a latente oposição dos comerciantes locais; e o próprio processo de recuperação do riacho, uma vez que, não havia o fluxo natural de água durante o ano todo, apenas durante a estação chuvosa no verão.

Mesmo diante de um cenário tão negativo o governo resolveu desativar e colocar abaixo o elevado e a base de concreto que esconderam o arroio. Para melhorar a integração entre norte e sul, 22 pontes – 12 para pedestres e 10 para automóveis e pedestres – foram erguidas. Para reduzir o congestionamento fora desencorajado o uso de carros no centro da cidade e linhas expressas de ônibus foram implementadas. Para tranquilizar os comerciantes locais inúmeros encontros foram realizados. Auxílio econômico e acordos foram feitos com vendedores que precisaram mudar seus estabelecimentos por conta da realização da obra. Para criar um fluxo contínuo, água do rio Han (Hangang) e de diversas estações subterrâneas de tratamento foram bombeadas para criar um fluxo que desse a profundidade de 40cm continuamente.

Cheonggyecheon
Vista do Cheonggye Plaza, começo da caminhada. Ao fundo a Ponte Gwangtong (construção original, data do século XV). Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Um dentre os vários caminhos de pedra para cruzar o riacho. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Debaixo de uma das pontes. As pessoas se reunem para conversar e escutar o barulho d’água a correr. Ao fundo a escultura colorida do Cheonggye Plaza. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Vista de cima de uma das pontes. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Vendedor de laranjas nas proximidades. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Menina a escutar o barulho d’água, imersa em seus pensamentos. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Caminhada à noite. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Vista à noite do córrego e dos prédios
Cheonggyecheon
Cheonggye Plaza ao fundo. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Casal tirando fotos. Foto: Alexandre Disaro
Cheonggyecheon
Texturas noturnas. Prédio ao longo da caminhada. Foto: Alexandre Disaro

A região vive um crescimento sem precedentes. Tanto de dia quanto à noite, andei sem me preocupar com a segurança. Muitas pessoas passeavam com o mesmo sentimento. Prédios novos e antigos, pessoas sorrindo e usufruindo de uma área urbana para todos. Ao caminhar à beira rio fiquei a refletir sobre tudo isso que acabo de compartilhar com vocês. Que incrível poder conhecer uma história de sucesso como essa. Um país com poucos recursos e um passado de disputa e guerra resolveu investir na educação do seu povo. Desejo muitos Cheonggyecheons para o Brasil. Que um dia possamos caminhar tranquilamente pelos nossos Tietês.

Como chegar?

 

A maneira mais fácil de se chegar é de metro. Há duas estações mais próximas:

1) Estação de metro City Hall (encontro das linhas 1 e 2), saída 4. Ao sair caminhe para o norte em direção à Cheonggye Plaza;

2) Estação de metro Gwanghwamun (linha 5), saída 5. Ao sair caminhe para o sul em direção à Cheonggye Plaza;

Vale comentar que a linha de metro 6 passa ao norte do Cheonggyecheon a poucas quadras do riacho. A linha 2 (circular) passa ao sul, também a algumas quadras. Informação útil caso queira chegar por outro ponto.

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CC-BY-NC

About the author

Sou fotógrafo, moro em São Paulo e já estive em 16 países. O Viver a Viagem é meu projeto pessoal e vai além de dicas triviais; quero proporcionar uma imersão cultural e ajudar você a viajar com um olhar diferente.